30 de abril de 2010

fantasia lusitana




portugal sempre gostou da parte fantasiosa da realidade.
somos uma espécie de povo bipolar que simultaneamente se acha o melhor e o pior do mundo (melhor nas coisas vagamente inúteis, pior em tudo o resto).
e ninguém melhor que a propaganda fascista soube materializar essa apetência para criar uma espécie de realidade paralela que, mesmo aqueles que sentiam na pele que era uma farsa, se iludiam com o brilho e a glória do império do minho a timor onde o sol nunca se punha.

fantasia lusitana, o ultimo filme de joão canijo, é um excelente documentário sobre essa realidade paralela, principalmente nos anos da guerra.
visto simultaneamente pelas imagens do cineasta-mor oficial do fascismo, antónio lopes ribeiro, e pela escrita de alguns refugiados que passaram por lisboa no ano de 1940 (alfred döblin, erika mann e saint-exupéry), portugal torna-se claramente um país bipolar: o da propaganda e o da realidade.
e o que é mais espantoso é que ainda hoje essa propaganda tenha efeitos tão permanentes na mentalidade dos portugueses e na imagem de paraíso terrestre que era portugal nesse período da história.
se as imagens e a locução permanente de lopes ribeiro por vezes se tornam de tal modo caricatas que levam ao sorriso condescendente, é principalmente através da imagem que os refugiados têm de nós que acordamos para a vida..

um filme a não perder.
um filme de claro serviço público

4 comentários:

Julio Amorim disse...

"melhor nas coisas vagamente inúteis, pior em tudo o resto.."

..gostei desta..!!

A Toupeira disse...

Eu sou dessas pessoas influenciadas pela propaganda. Depois de Eva nos ter retirado o paraíso, muitos ainda o procuram. Para alguns dos que não viveram antes de '74, o paraíso encontra-se no retorno ao rural e no menino a cantar as saias da carolina. Estou mortinha por ver o filme.

Um indivíduo disse...

Será? Creio que a diversidade humana é irredutível a tais "sínteses" caracterizadoras de um "povo" - ou do modo como um "povo" se vê a si próprio. Sermos os "piores", ou os "melhores", ou "bipolares", são apenas variantes duma história da carochinha, anulação do indivíduo em nome duma vulgata ainda vagamente marxista, mas agora sem Marx. Ah, o Povo... o bom Povo... o triste Povo. Leiam diariamente o Correio da Manhã - o jornal mais lido - e tentem, então, fazer essa síntese.

carlos disse...

caro indivíduo anónimo,

as generalizações são exactamente isso: generalizações.
servem para de um 'modo geral' caracterizar alguma coisa, pessoa, sociedade, população de um país ou de uma região, adeptos de um clube, fiéis de um qualquer credo...
acredito que como indivíduo anónimo goste de ter a sua indivudualidade salvaguardada e não integrada em 'marxistas' generalizações.
pela minha parte, por exemplo, acho normal que se diga que portugal é um país de católicos, mesmo sendo eu ateu (simplifica a coisa e eu não me ofendo pela vizinhança);
do mesmo modo acho normal que se diga que os portugueses são um povo latino, mesmo que os últimos estudos ao adn dos genes dos actuais habitantes do espaço ocupado pela nação portuguesa nos diga que cerca de 20% de nós têm genes árabes, uns outros 20% têm genes judeus e que os genes dos iberos seja apenas o terceiro duma lista ainda maior.
ou que ache bem que os discuros sejam dirigidos aos 'portugueses' (ultimamente também às 'portuguesas'), mas que não se estenda o rol aos transsexuais, aos cidadãos com dupla nacionalidade, aos cidadãos estrangeiros com direitos de cidadania e por aí fora a identificar todos os que em portugal têm direitos de cidadania.
as generalizações servem para simplificar o discurso de quem o faz de acordo com o que é a sua (neste caso a minha) opinião sobre o que escreve.
mesmo o exemplo do correio da manhã que gostou de aprensentar como exemplo da impossibilidade de generalizar a diversidade da portugalide, é um estilo que nasceu dos tablóides anglo-saxónicos, logo nada 'português', quando vitor direito tomou conta da direcção do jornal na sua fundação.

quanto à conexão marxista, caro indivíduo anónimo, agradeço-lhe o elogio mas, sinceramente, não acho que o mereça.
em qualquer dos casos, continuo a aconselhar-lhe a visão do filme.