11 de fevereiro de 2004

a companhia do poeta: ingborg bachman

DESPRENDE-TE, CORAÇÃO

E que testemunha afinal o teu coração?

Entre ontem e amanhã balança,

Desprende-te, coração, da árvore do tempo,

soltai-vos, folhas, dos ramos esfriados,

outrora abraçados pelo sol,

soltai-vos como lágrimas de olhos largos de longes.

Esvoaça ainda a madeixa dias inteiros ao vento

na fronte tisnada do deus do campo,

sob a camisa aperta o punho

já a ferida aberta.

Por isso resiste, quando o dorso macio das nuvens

voltar a curvar-se para ti,

não te iludas se o Himeto te encher

de novo os favos.

De pouco vale ao lavrador uma erva na seca,

de pouco um verão, face à nossa grande estirpe
silencioso e estranho,

e o seu bater

é já a sua queda para fora do tempo.

Ingeborg Bachman-Áustria-1926-1973

NOTA: Mandou-me este poema a minha querida cunhadinha. Tinha-lhe sido passado pela minha professora de português de muitos anos no liceu. Que se visse como eu escrevo e pontuo agora, arrancava-me os cabelos.
Como achei bonito, transcrevo e reparto.
E bons dias:)

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