16 de outubro de 2003

Hoje mando duas

Por interposta pessoa, entrei num diferendo bloguí­stico.
Ainda falo a propósito do problema do fumador passivo. A diferenda é com o médico explicador (que postou isto) e a interposta pessoa, o Aviz.

Em primeiro lugar quero concordar com a afirmação "Não vou discutir ciência na blogosfera". Eu também não e mais, não estou habilitado para tal, pois a minha área médica é outra. Apenas exprimo a minha opinião, fundamentada em alguma informação e conhecimentos cientí­ficos.

Em segundo lugar relembro uma frase que ouvi proferir, a um professor que admiro, algum tempo atrás "As convicções são coisas de religiosos e polí­ticos. A ciência é a arte da dúvida". Esta máxima mais se aplica aos médicos, devemos ter uma dúvida pertinente sobre todos os dogmas duvidosos e certezas incertas em que a medicina é fertil.
Não é difícil lembrar mitos que perduraram anos, como verdades absolutas, e hoje cairam no esquecimento: A posição dos lactentes a dormir, o papel decisivo do ácido na úlcera péptica, a amigdalectomia nas anginas, o carácter puramente psicológico das depressões, etc...

Em terceiro lugar sei que defendo uma causa "indefensável": a liberdade de fumar. Não tenho dúvidas (pertinentes) que fumar faz mal à saúde do fumador, que causa doenças crónicas e incapacitantes, que gera custos de saúde importantes e que tem efeitos sociais e económicos relevantes. Não tenho dúvidas... mas quanto aos efeitos no fumador passivo, tenho muitas dúvidas!

Comentando brevemento o exposto pelo meu colega diria que as afirmações da SPC e da ENSP são genéricas e não encerram, em si, nenhuma verdade científica rigorosa. Entendo-as como afirmações de princípios, de certa forma mais polí­ticas que científicas. Aliás a dúvida quanto ao problema dos fumadores passivos está bem exposta no segundo trecho: "...já o risco de contrair cancro do pulmão relacionado com os fumadores passivos levanta ainda algumas dúvidas em estudos recentes (Lee e Forey, 1996)..." Além do mais, estas e outras entidades, não detêm o exclusivo do rigor científico. Podem errar!

Quanto ao artigo de Calheiros e colegas, mantenho o que já disse: os estudos caso-contolo podem ser muito falaciosos, não são avaliadas outras exposições ambientais, não são avaliadas condições biológias predisponentes ao cancro e, nas conclusões europeias, só foi detectado um risco mí­nimo para exposição doméstica e profissional (não observada em 5 centros).
Continuo a pensar que a aplicação cega da estatística à medicina é perigosa. Estatisticamente tudo é possí­vel, até uma pessoa ter um testí­culo e um ovário.

Acho bem que se invista na educação e prevenção e se procure diminuir o número de fumadores.
O fumar em locais de trabalho deve ser fortemente restringido. Tem fundamento.
As restições de fumar em locais públicos não tem base científica suficiente. O único fundamento é a ditadura da maioria.
Não concordo nada que se tente atingir o objectivo de reduzir o número de fumadores, lançando sobre estes a ira dos não-fumadores, à custa do mito (até à data) do fumador passivo. É apenas o caminho mais fácil.

Por último: volto ao Aviz, os tipos de Bruxelas são uns merdinhas ao embicarem com o Português Suave. Estou com o Klepsydra, mude-se para Português Saudade!

E mais uma vez, desculpas aos meus colegas de blog. Isto não é para aqui!

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